Apesar de cada vez mais pessoas falarem abertamente sobre saúde mental, ainda existem muitos mitos sobre o processo terapêutico e de intervenção psicológica, que afastam quem mais poderia beneficiar dela.
Acredita-se, por exemplo, que só se procura terapia “em último caso”, que o/a psicólogo vai dar conselhos ou que a terapia é igual para todos. Talvez já tenhas ouvido o ditado que “de psicólogo e louco todos temos um pouco” ou já tenhas dado contigo a ouvir pessoas dizer coisas como “às vezes faço um bocado de psicólogo”. Tudo isto são ideias disseminadas que contribuem para uma perceção desajustada da intervenção psicológica.
Neste artigo, vamos desmistificar as ideias erradas mais comuns e procurar esclarecer aspetos importantes sobre a terapia e o que ela poderá ser — um espaço de escuta, compreensão e transformação.
A que nos referimos quando falamos de “terapia”?
A terapia psicológica, ou psicoterapia, é um processo onde uma pessoa é acompanhada por um/a psicólogo/a para trabalhar dificuldades emocionais, comportamentais e/ou relacionais.
Através da psicoterapia, é possível aceder a significados internos e desenvolver formas mais adaptativas de lidar com obstáculos e adversidades. A finalidade da psicoterapia é tratar questões relacionadas com problemas psicológicos e emocionais, assim como promover aspetos como o autoconhecimento e o desenvolvimento pessoal.
A psicoterapia consiste num processo dialético efetuado entre um profissional, o psicoterapeuta, que pode ser um psicólogo ou psiquiatra, e o paciente ou cliente.
Os objetivos centrais da psicoterapia são os seguintes:
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- Restabelecer o funcionamento psíquico da pessoa;
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- Permitir que esta compreenda as causas dos problemas apresentados, para que possa encontrar os recursos necessários para a sua resolução;
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- Desenvolver formas mais saudáveis e adaptativas de agir no mundo, redefinindo a sua identidade;
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- Solucionar problemas pontuais ao nível psicológico e emocionais, bem como analisar questões mais profundas e/ou existenciais.

Mito 1: “Só se vai à terapia quando se está muito mal”
A terapia não serve apenas para tratar doenças.
Pode ser útil em momentos de mudança, dúvidas, bloqueios ou simplesmente como um espaço de reflexão.
Procurar ajuda quando algo começa a incomodar é uma forma de autocuidado — e pode evitar que o mal-estar se agrave.
Como saber se devo ir à terapia?
A psicoterapia está indicada para várias situações clínicas do foro psicológico e emocional, como por exemplo depressão, fobias, ansiedade, problemas do comportamento alimentar, stress pós-traumático, entre muitas outras.
No entanto, não é preciso existir um diagnóstico para que se recorra a este processo. Na verdade, ele também é indicado para a resolução de conflitos e problemáticas pessoais, familiares, conjugais, profissionais…
O mais importante é a pessoa identificar questões emocionais que estão a ser um entrave ao seu bem-estar e funcionamento.
Poderás também fazer algumas perguntas a ti mesmo/a para perceber se a terapia poderá fazer sentido:
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- Sentes-te confuso/a, perdido/a, triste e desamparado/a;
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- Os problemas sentidos não parecem melhorar, apesar dos teus esforços e/ou dos esforços e da ajuda de amigos e família;
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- Pensas frequentemente sobre o problema ou tens dificuldade em não estar focado/a em pensamentos negativos;
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- A forma como te sente ou o(s) problema(s) estão a afetar o teu trabalho ou o teu funcionamento geral no dia-a-dia ou a relação com os outros;
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- A tua forma de agir atualmente está a prejudicar-te a ti ou aos outros;
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- Sentes-te confuso/a, perdido/a, triste e desamparado/a.
Mito 2: “Ir ao psicólogo é sinal de fraqueza”
Reconhecer que se precisa de ajuda é um ato de coragem, não de fraqueza.
O estigma associado à saúde mental ainda pesa, mas está a mudar. Procurar terapia mostra responsabilidade e respeito pelo próprio.
A força não está em aguentar tudo sozinho — está em saber pedir apoio.
Mito 3: “O/a psicólogo/a vai dizer-me o que fazer”
O/a psicólogo/a não dá conselhos, nem soluções prontas.
O processo terapêutico é um processo conjunto: o/a psicólogo/a faz perguntas, ajuda a organizar o pensamento e a ganhar clareza, mas as decisões são sempre da pessoa.
O processo é feito ao teu ritmo, com respeito pelo teu caminho.
Mito 4: “A terapia é só falar da infância”
Embora possa ser importante perceber de onde vêm certos padrões, a terapia não fica presa ao passado.
Trabalha-se o presente, as emoções atuais, os relacionamentos, as escolhas. O objetivo é perceber como tudo isso se relaciona — e usar essa consciência para avançar.
Mito 5: “Já fui a um psicólogo e não resultou, por isso não é para mim”
A ligação entre psicólogo/a e paciente é essencial.
Às vezes, é preciso procurar o profissional certo — com uma abordagem e estilo que façam sentido para ti.
Não é sinal de falha, mas de respeito pelo teu processo.
Mito 6: “Se estou a tomar medicação, não preciso de terapia”
Medicação e terapia podem (e muitas vezes devem) andar de mãos dadas.
Enquanto a medicação pode ajudar a estabilizar sintomas, a intervenção psicológica trabalha as causas, os padrões emocionais e o impacto nas relações.
É a combinação entre as duas que, muitas vezes, promove mudanças mais profundas e duradouras.
Mito 7: “A terapia é sempre igual, seja com quem for”
Existem vários tipos de psicoterapia e várias abordagens (como cognitivo-comportamental, psicodinâmica, focada na compaixão, entre outras).
Cada psicólogo/a adapta a sua intervenção ao contexto, à pessoa e aos objetivos definidos.
O processo deve ser único — como tu.
Conclusão: terapia é cuidado, não tabu
A terapia não é mágica, mas é transformadora. Não é só para “quem está mal”, é para quem quer viver com mais consciência, equilíbrio e autenticidade. E se tiveres dúvidas, lembra-te que o papel do/a psicólogo/a é precisamente o de ajudar a esclarecer e de conduzir o processo. Não tens de saber tudo, nem de ter todas as respostas.
Desmistificar é o primeiro passo. Cuidar de ti, o segundo.